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Nicolas Saad

O Brasil sob nova direção

“Estou preparado para o pior, mas torço pelo melhor.”

Benjamin Disraeli[1]

Nesta carta, analisamos a performance dos fundos da Persevera no ano de 2022. Repassaremos as estratégias e resultados do Persevera Compass Multimercado e do Persevera Nêmesis, nosso fundo de renda variável long bias defensivo. A análise do Compass também se aplica ao Persevera Compounder, nosso veículo previdenciário. Os fundos Persevera Phoenix Renda Fixa Ativo e Persevera Trinity DI ainda não completaram 6 meses de histórico.

O ano que passou foi um dos piores da história para os mercados financeiros. A combinação sempre diversificadora entre ativos de renda fixa longos e ativos de risco – conhecida como paridade de risco – sofreu a maior perda em mais de 30 anos. A intensa elevação de juros implementada pelos bancos centrais globais para reverter o processo inflacionário provocou perdas tanto nos mercados de risco – ações, moedas contra o dólar, spreads de crédito – quanto nos mercados de renda fixa. Mesmo as commodities, que, como argumentamos na carta de outubro, apresentam importantes limitações de oferta, mostraram quedas de preços da ordem de 20% do pico de abril.

Os ativos brasileiros chegaram a se destacar positivamente até outubro, mas esse movimento foi revertido com as primeiras sinalizações para a política econômica da nova administração, que trouxeram de volta as preocupações com o risco fiscal. De fato, o desempenho dos ativos brasileiros poderá ser muito diferente em 2023 a depender das políticas econômicas do novo governo, como discutimos na última carta e revisitaremos adiante.

Persevera Nêmesis: long bias com perfil defensivo Como descrevemos em nossa carta de abril, o Persevera Nêmesis busca uma exposição à renda variável rigorosamente cuidadosa com o risco, objetivando capturar a rentabilidade de longo prazo do mercado de ações com uma volatilidade e quedas muito menores. Anteriormente um book do Compass, o Nêmesis teve início como fundo independente em 25 de fevereiro de 2022. Desde então, apresentou uma rentabilidade de -1,94% contra -3,01% do Ibovespa, com uma volatilidade muito mais contida: 6,3%a.a. contra 21,8% do índice.

Além disso, o fundo se destacou no período em relação ao seu peer group, tendo apresentado um drawdown bastante controlado de -4,7%, contra uma mediana de -9,3%.

De forma agregada, a carteira de ações superou o Ibovespa em 405 bps[2], nossas posições em futuros de Ibovespa agregaram 116 bps e, em futuros globais, outros 44 bps. Do lado negativo, nossas posições de hedge em juros globais deduziram 136 bps e as exposições a ouro detraíram outros 117 bps. Como apresentamos na carta, utilizamos futuros, juros, commodities e outros instrumentos com o objetivo de gerenciar a exposição direcional, o que contribui para a proposta de defensividade do fundo.

Em relação à carteira de ações, as principais contribuidoras no período foram as posições compradas em BB Seguridade e Vale e as posições vendidas em Bradesco. Do lado negativo detraíram valor as posições compradas em Petrobras, BTG Pactual e Aura Minerals. Resultados do Persevera Compass No último trimestre, mantivemos posições mais reduzidas nos ativos locais, principalmente após o resultado das eleições. Ainda assim, por conta da piora expressiva dos mercados, as posições em juros locais detraíram 110 bps, as exposições em renda variável subtraíram outros 103 bps e as posições em dólar/real -17bps. Do lado positivo, destacaram-se as posições nos mercados de commodities, que agregaram 14 bps e as posições aplicadas em inclinação da curva de treasuries +8 bps.

Cenário internacional em 2023 O ano que se encerrou foi caracterizado por uma contração monetária global sincronizada. Após reconhecer, no último trimestre de 2021, que o processo inflacionário não era apenas transitório, o Fed[3] iniciou um intenso processo de elevação da taxa básica de juros. Outros bancos centrais implementaram a mesma medida, juntando-se às autoridades monetárias que já vinham implementando políticas restritivas – como o Banco Central do Brasil.

Além disso, em diversas economias, os estímulos fiscais pós pandemia também foram encerrados ao longo de 2022, o que contribuiu conjuntamente para desaquecer a atividade. De fato, embora os números de emprego na economia americana continuem bastante positivos – uma vez que são um dos últimos indicadores a reagirem a viradas no ciclo econômico –, é possível identificar um arrefecimento no número de vagas em aberto, que caiu de um recorde de 12 milhões em março para o nível de 10 milhões.

Indicadores mais sensíveis à elevação de juros já começaram a apontar para uma desaceleração mais relevante na atividade nos próximos meses. É o caso do mercado de imóveis, que vem mostrando uma rápida reversão dos níveis aquecidos pós pandemia. Somado à perspectiva de continuidade da desaceleração da inflação, esses dados começaram a mover a preocupação do mercado para uma possível recessão em 2023.

Outro fator que finalmente começou a contribuir para a desinflação global é a normalização das cadeias produtivas. A desorganização causada nos sistemas produtivos e logísticos pelos lockdowns levou cerca de dois anos para ser revertida, mas finalmente o índice de stress sobre cadeias produtivas do Fed de Nova Iorque e os preços dos fretes em containers na China se aproximam dos patamares pré-covid.

O desaquecimento do mercado de trabalho e a melhora nas cadeias produtivas são fatores importantes para a continuidade da desinflação na economia americana. Por outro lado, como argumentamos na carta de outubro – “Combatendo a inflação sem ajuda das commodities”, as restrições de oferta no setor de commodities poderão tornar o trabalho dos bancos centrais mais difícil:

“[...] em períodos de oferta restrita, o impacto [da restrição de demanda sobre os preços das commodities] tende a ter curta duração, pois, no médio prazo, os custos variáveis de produção impõem um limite para a queda de preços [...]. Em outras palavras, a queda de preços será menor, e o trabalho de redução da demanda tenderá a ser mais custoso para a economia global.”

A reabertura da China Apenas nos últimos meses, a China começou tomar ações para encerrar a política de covid zero, que vigorava havia cerca de dois anos. Em 2022, com duas ondas das variantes mais recentes da doença, a política exigiu repetidos fechamentos e restrições em grandes centros do país asiático, comprometendo de forma relevante a atividade econômica. Além disso, as restrições ao endividamento no setor de construção impostas em 2021 também continuaram pesando sobre a economia chinesa, mas, de forma análoga, também já começaram a ser revertidas.

A combinação desses dois fatores deverá ser bastante positiva para a atividade econômica em 2023. Por um lado, essa reabertura tende a piorar a situação inflacionária global, colocando mais pressão sobre mercados de commodities já apertados. Por outro lado, uma reabertura definitiva na China contribui para a normalização das cadeias produtivas, reforçando a queda da inflação de bens industriais.

Continuamos com a visão de que o trabalho de desinflação ainda não está completo. A combinação entre reabertura na China e restrições de oferta nos mercados de commodities exigirá uma desaceleração mais forte da demanda. Como acreditamos que o Fed não pretende recuar das políticas contracionistas até observar uma normalização da inflação, seguimos acreditando que o maior risco econômico em 2023 é de um hard landing, ou seja, que a dose de política monetária implementada venha a causar uma forte desaceleração, ou mesmo uma recessão.

Para os mercados globais, esse cenário continua a ser desfavorável. Apesar da queda dos múltiplos do mercado de ações, as projeções de lucros caíram apenas modestamente, não refletindo ainda a possibilidade de uma recessão mais forte.

No caso da renda fixa, o cenário parece ser menos negativo. No curto prazo, surpresas inflacionárias advindas, por exemplo, da reabertura da economia chinesa poderiam levar a elevações adicionais dos juros ao longo da curva. Ao longo de 2023, no entanto, os efeitos defasados da política monetária deverão ser sentidos mais fortemente tanto na atividade quanto na inflação. Nesse momento, o nível atual de cerca de 4%a.a. das taxas de longo prazo nos EUA poderá se mostrar uma boa oportunidade de investimento.

Um cenário local binário

O pano de fundo do cenário global discutido acima, ao menos no curto prazo, é positivo para o Brasil. A reabertura da China e os preços de commodities elevados ajudam o país pelo lado dos termos de troca. Junto ao alto diferencial de juros, isso oferece um sólido suporte à taxa cambial brasileira. Combinando-se a um processo de alta de juros já avançado e ao melhor resultado primário desde 2013, existem condições de contorno bastante favoráveis para a economia brasileira.


A primeira interação da nova administração com os mercados financeiros, no entanto, causa bastante preocupação. O desenho inicial da PEC de transição proposto pelo novo governo indicou uma grande disposição para expansão fiscal, na medida em que representava um pedido para elevação do teto de gastos em R$200 bilhões pelos próximos quatro anos. Felizmente, o arcabouço constitucional do teto de gastos levou a uma expansão dos gastos planejados mais modesta – “apenas” R$168 bilhões, por um ano.


A redução do tamanho dos gastos autorizados pela PEC trouxe alguma calmaria para os ativos brasileiros ao longo de dezembro. No entanto, a desconstitucionalização do regime fiscal, aprovada na mesma medida legislativa, aponta para a possibilidade de que o novo governo venha a tentar novas expansões relevantes no futuro.


Acreditamos que esse ímpeto expansionista do lado fiscal poderá prejudicar muito os ativos brasileiros, como já vem ocorrendo desde a eleição. Por um lado, uma “foto” fiscal positiva não resiste a um “filme” ruim, como vivenciamos no período 2010-2015, colocando em risco o cenário benigno mencionado para o câmbio. Além disso, pelo lado da demanda, introduzir estímulos fiscais quando a economia começa a desacelerar pode levar o Banco Central a rever a estratégia monetária e, no extremo, a reabrir o ciclo de alta de juros.


Em conclusão, a política econômica do novo governo definirá o rumo dos ativos brasileiros em 2023. Se, por um lado, os impulsos fiscais e parafiscais forem comedidos, poderemos reviver o período 2003-2009, com grande prosperidade econômica e redução de desigualdades. No entanto, se voltarmos às políticas da “nova matriz macroeconômica”, o desempenho da economia poderá ser diametralmente oposto. Como recomendado pelo ministro britânico Disraeli na citação que abre esta carta, é necessário se preparar para 2012, mas torcendo por 2003.

Equipe Persevera.






 

[1] Primeiro ministro britântico, “I am prepared for the worst, but hope for the best.” https://www.brainyquote.com/quotes/benjamin_disraeli_154186, acesso em 28/12/2022. [2] 1 bp, “basis point” ou ponto base corresponde a 0,01% [3] Federal Reserve, banco central norte americano

 

(11) 4780-3794



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